quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Vol. 1 - bl 3 (conclusao)


[...]
Enquanto os pais de Heilmann nada se deixavam experimentar dos propósitos do filho e nós o visitávamos como se fôssemos camaradas do Esporte Clube Eichkamper, com a bola de futebol na bolsa de rede, havia na família de Coppi, como também junto a nossa [a do Narrador], simpatia a todos os debates sobre as dubiedades da vida política. Esta possibilidade, de também poder discutir as próprias obscuridades e falácias, era decisiva para o nosso avanço, e Heilmann fazia parte aqui da cozinha de Coppi tanto quanto da casa de seus pais no [distrito de] Westende. Como os conflitos de gerações eram para nós um sinal de dependências econômicas, numa sociedade, cujo declínio nós esperávamos, assim tínhamos de, com autoridade, abolir o departamento de educação depois dos privilégios de classe. O desinteresse pelas questões sociais, políticas, científicas e estéticas da época, débil inatividade, pauperização espiritual, opiniões inexpressivas eram mais frequentes de encontrar entre filisteus e também entre os membros da burguesia do que junto às massas, que eram excluídas dos institutos culturais e extenuadas através de trabalho árduo e monótono. Desde a precoce juventude eu estava habituado às declarações claras e evidentes sobre as estruturas de propriedade e os mecanismos da Economia, sobre a situação da pesquisa [técnica], sobre a produções artística, sobre as condições do país e outros países e continentes dos quais viemos a saber, que suas experiências lá tinham realizado, onde ocorria a confrontação de forças oponentes, que imediatas estavam incluídas nos focos de crise do processo social e os quais não conhecidos, e qual invenção e descoberta feitas em serviço da dominação e quais eram de uso coletivo, além de informação que se poderia conseguir sobre os beneficiados, suas faces e nomes, qual lucro eles tinham explorado dos trabalhadores. Seguiam-se aqui às coisas elementares, para a investigação de fraudes e crimes na empresa e no mercado imobiliário, na administração municipal e estadual [estatal], na diplomacia internacional e nas cidadelas dos monopólios e trustes, seguiam-se debates sobre imprensa, sobre exposições de Arte e livros recém-lançados, para as opiniões de política partidária e das constelações de poder em todo o mundo, e diante do delírio do poder mantínhamos a Crítica aos representantes nos ofícios e sindicatos, envolvidos nas conversas sobre reivindicações salariais, segurança do trabalho ou ações de greve, e o que sabíamos sobre as situações nos países atrasados do sul da Europa, nos ghettos dos Estados Unidos e nas colônias, nos quais os povos começavam a luta de libertação. Seguramente muitos não podiam se expressar, degradados através de doutrinação, anestesiados por derrotas, porém se começassem a falar, logo mostrariam exatamente os processos que estavam envolvidos, e onde eu chegava sempre a ouvir uma opinião oportuna, uma nova referência à compreensão de uma questão atual. Associações de trabalhadores, de pais, de vizinhos, às vezes também visitantes estrangeiros, metalúrgicos da Boêmia, camaradas italianos e espanhóis, com os quais a minha mãe, nascida em Estrasburgo [Strassburg], falava um francês com sotaque para facilitar a compreensão, quando nos sentávamos nas tardes de sábado e nos domingos, frequentemente na cozinha, que era a nossa sala-de-estar. Meu pai, desde jovem um social-democrata, seguramente o único prisioneiro político, que jamais esteve preso na detenção de Nagy Emöke de pátria húngara, devido à agitação contra a atividade de guerra do monarca imperial da Áustria, então ele próprio foi forçado ao serviço militar, e ficou gravemente ferido, na primavera de mil novecentos e dezesseis, e foi conduzido da fronteira da Galícia para a Alemanha e então teve alta do hospital, e foi morar em Bremen. Aqui eu nasci em oito de novembro de mil novecentos e dezessete. Meu pai tinha conseguido emprego no estaleiro do [rio] Weser e estava, devido a sua atividade na associação educativa dos trabalhadores, em cooperação com o jornal Política Trabalhista [Arbeitpolitik], que mantinha relações próximas com a Liga Espártaco [Spartakusbund]. Em novembro de dezoito, depois da proclamação da República Socialista, por Liebnecht, ele estava em Berlim, e em seguida novamente para a revolta revolucionária em Bremen, habilitou-se então nos anos 20 através de autodidatismo para o exame para Engenharia, não teve, contudo qualquer possibilidade de ascensão profissional, ao contrário era sobretudo trabalhador nas docas/estaleiros, em oficinas mecânicas, até ele, depois disso levar-nos para Berlim, devido ao avanço técnico, que ele conquistou em seu serviço, sendo nomeado para encarregado [Vormann]. Ele era, pois, do tempo da radicalização política dos social-democratas independentes, em março de mil novecentos e vinte e um tornou-se novamente filiado do Partido da maioria, porque oferecia-se a ele aqui, como ele pensava, melhores condições para as atividades dentro das organizações sindicais. Apesar de sua direção partidária manteve-se, durante as lutas em Berlim e Bremen, ao lado dos rivais, e ele também depois disso sempre entrou em conflito com a política deles, ele defendeu, porém, firmemente uma visão que o Partido através da massa de trabalhadores poderia levar à formação de uma Frente Única socialista. Era, apesar de sua luta por uma unidade de ação, havia nele algo de um anarquista, de um sindicalista, assim como ele sempre desconfiou de funcionários, oficiais, burocratas e diretores, assim foram para ele detestáveis os funcionários e pelegos [Bonzen] em seu Partido. O Partido, que fora para ele a associação dos trabalhadores, e ele não abandonou sua expectativa que estes do Partido mostrassem suas faces. Ao Partido Comunista ele não se filiou, pois ele não poderia criar um acordo para o Centralismo. Ele viu no poder-de-comando das instâncias diretivas e a obediência das subdivisões um princípio que não estava em acordo com seu conceito de Democracia. Também ele rejeitava a reivindicação à absoluta escolha-de-crença, porque esta, como ele dizia, tinha caráter religioso e a ele lembrava a decadência das autoridades. Enquanto ele atuou junto aos trabalhadores, apáticos, de se filiarem aos social-democratas e aos comunistas, e contra as advindas tendências anticomunistas no sindicato, ele emprestou sua voz ao Partido Social-Democrata, na verdade cada vez com um violento fracasso contra a última manobra deles de retrocesso e de compromisso, porém com a confiança de que os trabalhadores aqui, sem a supressão do Estado, muito mais usando-o, seria suficiente para o controle e gradual apropriação da produção. O conflito entre Reforma e Revolução era entre nós um constante tema, talvez foram as experiências dele durante as revoltas após a Guerra [Grande Guerra, ou Primeira Guerra Mundial], que a ele tinham convencido que não através de intervenções violentas, ao contrário, apenas através de lento fortalecimento e expansão do movimento dos trabalhadores, não através da luta armada, ao contrário, por meios parlamentaristas, a mudança social seria alcançada. Perguntado, se não demoraria muito tempo, se através do oportunismo, da tolerância dos poderes burgueses, com o adiamento de cada demanda, seria quebrada a vontade de lutar, ele respondia apenas que as forças de sustentação dos dois grandes partidos desde sempre estariam prontas para uma reunião, e que apenas a direção não tinha encontrado o caminho, e no próprio início dos anos trinta, que também o rápido crescimento da ameaça fascista, não poderia levar sua direção a um entendimento com os líderes do Partido Comunista, ele ainda sempre apoiou a vinda da razão proletária para um possível e calculado até mesmo brevemente antes de janeiro de trinta e três com poderosa contra-demonstração que desviaria na última hora o decair da classe operária. Ele prosseguia em semelhante ponderações, com o ombro esquerdo levantado, que era rígido desde o ferimento causado por um projétil alojado na carne, durante o combate na ponte do Kaiser [Kaiserbrücke] em Bremen, o que a ele dava uma postura de cético. Ele era amigo de Merker, que pertencia ao Comitê Central do Partido Comunista, e que há um tempo, quando os socialdemocratas eram, nos slogans comunistas, rotulados de 'social-fascistas', nos encontros de sindicatos filiados para uma atuação em conjunto e, como grupos socialdemocratas constituídos para continuar o trabalho ilegal no país, à estes seu apoio ofereceu. Merker, Dittbender, Münzenberg, Ackermann, Wehner foram apenas alguns dos numerosos comunistas, com os quais ele atuou na atividade profissional e no seu trabalho conjunto com o Auxílio Vermelho berlinense, onde ajudou aos camaradas estrangeiros, e tornou-se conhecido, tanto que o encorajaram seus esforços rumo a uma superação das rivalidades político-partidárias. Depois da queda em-separado dos partidos dos trabalhadores, depois da atemorizada submissão da grande maioria, ficaram nomes dispersos a resguardar, com os quais nós ainda por um longo tempo, em nossa separação, unimos em tradição, porém já fragilizada, e quando ninguém mais com segurança poderia ser personificado. Pessoas tais como os meus pais, os pais de Coppi, foram outrora por toda parte encontradas na população trabalhadora, elas foram, na atitude delas depois, internacionalistas, elas permaneceram, se socialdemocratas ou comunistas, além de feudos partidários participavam, enquanto por cima das cabeças delas foi conduzida a decisiva política, sem muito de se convencer, num coletivo ideológico em vez de separadas, a seguirem uma convicção. Um longo ano, ainda, igual a muitos outros, a esperar a reação, depois do mortificante teste, num tempo de espera, de hibernação, anos, décadas, se prolongam, daí meu pai se dirigir para a Tchecoslováquia, onde foi novamente buscar trabalho. A migração mostrou-se pesada para ele e minha mãe, e apesar de na cidade de Warnsdorf, no norte da Boêmia, ter sido empregado numa fábrica têxtil, por ajuda do Partido e do Sindicato, segundo falavam as cartas que eu recebia de meus pais, sobre os esforços de adaptação e, em alusões ocultas, de uma insegurança, que também lá constante se alastra. Num momento, em que a cidadania tchecoeslovaca ainda uma certa proteção oferecia, os meus pais conseguiram escapar à perseguição política, e também eu poderia, com meu passaporte tcheco, e assim por longo tempo eu poderia comprovar um emprego e um endereço permanente, e dedicar-me novamente à minha educação. Mais difícil era para a família Coppi resistir à pressão, pois o pai foi, por ora, demitido da companhia de armamentos das oficinas mecânicas Berlin, onde ele havia sido envernizador, já que ele tinha se recusado a ingressar nas organizações nacional-socialistas, e conseguiu então, pois ele devia fazer concessões, um trabalho subordinado, cujo salário, junto com o vil rendimento do trabalho-por-hora da mãe, dificilmente era suficiente para a sobrevivência. Apenas o pedaço de terra, que Coppi possuía na horta urbana associada Orla-da- Floresta [Kleingartenverein Waldessaum] em Tegel, poderia com batatas, nabos e feijões cultivados, ajudar no tempo de necessidade. A opressiva incerteza impedia-nos, entretanto, tampouco como antes, a buscar incentivos culturais. De fato, não tínhamos fartura de literatura nas estantes, fazíamos empréstimos de livro a cada semana na biblioteca pública, pela época da visita de Hodann, eu tinha também vez ou outra a ele pedido os livros que ao nosso apartamento trazia, e de bom grado emprestava, porém os volumes que a nós pertenciam, com cuidado eram selecionados, ele eram parte existencial de nossas vidas, adquiridos por papai ou mamãe. Devido a numerosas mudanças transportados, vários ainda provenientes de Bremen, assim fizeram, junto a louça e roupa de cama e malas de roupas, nossos únicos bens seguros, então nos móveis nós víamos bens casuais, baratos e já usados, carregados em carrinho-de-mão para a nova moradia, depois rapidamente vendidos antes da mudança para uma outra cidade. Possuíamos uma antologia de poemas de Maiákovski, algumas obras de Mehring, Kautsky, Luxemburg, Zetkin, Lafargue, alguns romances de Gorki, Arnold Zweig e Heinrich Mann, de Rolland, Barbusse, Bredel e Döblin. Em lugar de ornamentos de crochê, ou vasos de porcelana, meus pais tinham sempre estes pequenos blocos/volumes de camada espessa, apertados com conhecimento, propostas, instruções em adquirido papel impresso, e também quando o dinheiro era escasso, podia acontecer de meu pai ou minha mãe chegasse em casa com um novo livro de Toller ou Tucholsky, de Kisch, Ehrenburg ou Nexö, e nos sentávamos, à tarde, sob a lâmpada da cozinha, líamos alternados e então discutíamos, entre nós, o conteúdo. Qual o significado destes livros e com que efeito nos uniram, mostrou-se naquela época, quando um ou outro era detido pela polícia a confiscar os livros que tínhamos conosco, e os nomes dos autores eram usados como uma prova contra nós, e quando o livro era de Lênin então equivalia a uma alta traição. Sempre era mais reduzida, por isso, a quantidade de livros, que junto a nós conservávamos, sob a pilha de lenha junto ao fogão da cozinha de Coppi já sem espaço, com uma introdução de O Capital [Das Kapital, obra teórica de K. Marx], alguns recortes de jornal com discursos de Dimitroff e Stalin, os útimos números da Bandeira Vermelha [Roten Fahne], ocultos dentro do Observador Popular [Völkischer Beobachter], e os puídos, passados de mão em mão, camuflados como cadernos-brochura, providos com uma capa marrom com o título Wallensteins Lager [drama de F Schiller] a tratar sobre o processo do incêndio do Reichstag. Pouco ainda se falava da frieza e da pobreza das casas dos trabalhadores nessa época de vazio intelectual, sendo conhecidas as atividades políticas, das quais antes ninguém fizera segredo quando de sua filiação ao Partido [comunista], sendo que as listas de afiliados estavam nas mãos da polícia estatal [Gestapo, Geheime Staatspolizei, Polícia Secreta Estatal], vivíamos a ruptura, sendo vigiados por representantes, vigias de quarteirão [Blockwaltern], líderes de região, SA [tropas de assalto] e SS [tropas de proteção], e afiliados, amigos próximos estavam nas prisões, em campos de trabalho forçado [Straflager] ou no exílio, e os que voltavam viam-se apenas com os mais indispensáveis. Mas ainda mantinham limpos e ordenados, nunca exatamente em salas-de-visitas, pois muitos moravam juntos apertados, abandonados à decadência, quando a escassez pressionava a emudecida e dificultosa revolta contra o ataque de desmoralização e estupidificação.




[pausa]



LdeM

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