domingo, 15 de maio de 2011

Volume I - bloco 7 (2/2)









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Coppi achou este olhar frio, incomunicável, o caráter definitivo do descrito parecia-lhe fatídico. Os maiorais [a Elite] mantinham-se cercados por armas, por estandartes, protegidos por uma abóbada celeste, e separados, sempre em gestos de mútua destruição, estavam os soldados. Nem as pernas dispersas do cavalo, nem o machado que balançava, ao lançamento de um dardo, tiravam a oportunidade de um movimento contínuo, uma mudança de lugar. Nas atitudes equilibradas não se pensava qualquer queda ou arremesso contrário, nem qualquer volta ou giro, mudança ou revolução. Nada havia de diverso desta peculiaridade destes concentrados segundos que se observava, tudo o mais era excluído em favor dos aspectos visuais de um entrelaçamento de artesanato de cestos [Flechtwerk], mantendo-se fora das linhas de espadas e lanças, das rédeas e das barras de estandartes, as curvas dos escudos, dos elmos e coxas de cavalos, das colunas e pilares das pernas, da gradação dos braços, mãos e faces, dos pontos de vista dos olhos sob escuras sobrancelhas. Daí veio a estranheza, a excentricidade da pintura, que esta, apesar de seu conteúdo figurativo, queria imitar nada da Natureza. Possuía sua luz peculiar, e o acontecimento nela [na pintura] era uma harmonia de colorações. Uma tal declaração seria especulativa, disse Coppi, e não desenvolvia o nosso assunto. O que então foi combatido nada tinha a ver com a nossa luta. Porém as objeções serviam, aquelas que apresentávamos, com frequência apenas quanto a isso, para aguçar nosso julgamento. Por que, nos perguntávamos, nós nos interessávamos por esta pintura que na escolha de seus agrupamentos baseava-se em divisões de classes. Porque precisávamos do conhecimento de tais obras, que considerávamos em seu integridade. Precisávamos destes singulares produtos sofisticados da Arte, da Literatura, para ser um complemento para o nosso lado, sem qualquer monumento, e conhecido pela pobreza e pela miséria. Juntamente podia emergir alguma hostilidade. Porém sempre de novo predominava o impulso que, ao tratar com o hostil, indiferente queria opor-se a nós, como se além disso apenas para dar-nos tema de estudos. Assim igual as sombras, que no jogo variado dava aos corpos ar e vivacidade, eram banidos, assim era apesar da confusão de pernas, nenhuma marca de patas ou cascos visível em todo aquele chão. De forma estatuária destacavam-se os corpos em tumulto, envoltos com malha de escamas, couraças-de-ombro e escudos, porém ninguém possuía realmente alguma consistência, realmente peso. As faces dos guerreiros olhavam fixamente, sob os gigantescos elmos, imóveis e apáticos, para além do cruzar de armas. Às vezes minha memória projetava um detalhe da pintura nas caldeiras, cilindros e êmbolos das centrífugas, com as quais eu trabalhava. Na maioria das vezes, as faces eram insensíveis, porém cheias de expressividade, sérias, silentes, meio ao confronto, que eu via diante de mim, três delas com tons de branco e profundo verde destacadas, estavam entre ornamentos de armaduras, espadas e lanças junto-acotoveladas, a primeira oblíqua e frontal, emoldurada por uma barba com manchas brancas, a segunda em perfil, com abobadado nariz em forma de bico, com um lábio inferior avançado, a terceira atrás destas, os dentes brilhando na boca aberta, a bochecha fendida por um golpe, transbordando de sangue, e no apoio mútuo, porém, mantinham-se cada um por si, com o mesmo olhar meditativo. Intercalada entre uma cortante e avançada viseira fechada, de um trombone, de uma clava, uma cabeça de cavalo olha uma outra com extrema atenção ao encontro de quem observa, e assim muito ele havia recorrido a este procurar, que ele não percebia, o que lhe fora infligido, pois atrás dele avolumava-se um punho ao redor do nó do punhal, cuja ponta perfurava-lhe a garganta. O drama, elemento neste período da história da verdadeira cruz, acontecia assim ao mesmo nível a um segundo trecho, porém aqui não confinado, oculto, mas ao contrário bem evidente, quase como se apresentado à instrução. Justo agora um braço estendido cuja mão azulada agarrava leve e frouxamente ao artístico cabo cinzelado e golpeava o longo e fino fio de corte fundo na vertical garganta para-trás-encurvada do adversário. Este voltava seu perfil com o queixo para cima, seu crânio ficava na casca do elmo pintado com um padrão floral, e a face do seccionado acima dele pressionava a mesma cuidadosa e prática reflexão que devia ter guiado o pintor na criação de sua pintura. E já víamos também, como nas obras, que eram dedicadas aos preferidos e escolhidos, as faces dos soldados, dos servos se faziam valer, como eles se destacavam, mas convincentes, mais fortes e mais experientes do que seus próprios senhores. Nas obras de Mantegna e Masaccio, Grien, Grünewald e Dürer, nas obras de Bosch, Brueghel e Goya os trabalhadores já entravam em primeiro plano. Os pastores e os pescadores, que tinha se conformado a suas funções decorativas, perderem de súbito, nas pinturas de Poussin, a simplicidade e brandura deles e carregarem sofrimentos, como se eles estivessem descritos em tragédias clássicas. Um ferreiro, um marceneiro seriam em La Tour com seus trabalhos assim destacados, que eles ocupavam sozinhos nas molduras, sem mandante e comprador. Vermeer, Chardin conservavam maturidade, beleza não para os mestres, mas para as costureiras, as lavadeiras, as empregadas domésticas. Fossem as ordens determinadas historicamente, as condições de uma determinada época uma vez reveladas, assim nos defrontaria uma duradoura imagem da realidade, e isso se deixaria distinguir, em que grau o artista preparava o desenvolvimento futuro e qual atitude ele tinha adotado diante da opressão suportada século após século. Em muitas obras, indiferentes, se Príncipes, Prelados ou Mecenas especulativos tivesse sido apresentados nelas, pois elas possuíam a permanência de um peculiar sentido de verdade, na superação de preconceitos e limites, desde então incluído o elemento da perda de classes. A renovação social, a aceitação de descobertas e conquistas das mãos dos dominantes, a produção do poder em particular, a fundação do nosso pensamento científico, estes eram temas que nós podíamos nos apresentar na Arte, na Literatura. Porém em vistas das possibilidades inumeráveis da expressão, que tínhamos conhecido, e as diversas capacidades de recepção, reações e retoques em que ponderávamos, chegávamos à convicção que se desenvolveria entre os intelectuais socialistas uma nova Arte e que o caminho daqueles de igual disposição de suas tendências certamente despachariam todas as diretivas programáticas. Também foram suficientes as aberrações e tentativas fracassadas, quando elas permaneciam ao lado da Revolução, e cada um deveria selecionar a partir das possibilidades disponíveis do antigo e do novo, o que corresponderia aos seus próprios pensamentos. Nós, que nos informávamos a partir de uma iniciativa peculiar sobre os eventos da atualidade, que extraíamos daí as nossas conclusões e tínhamos escolhido nossa filiação política, também exigida pelo Partido, ao qual pertencíamos ou nos aproximávamos, que merecia a escolha, aí encontrávamos a área cultural. O fato de que nós jovens trabalhadores, como também nossos pais e mães, que crescêramos sob os tempos de guerras e carestia, geralmente nos envolvíamos com Arte e Literatura, e que assim de pronto eram as próprias descobertas, que podíamos contra por às condições sufocantes de vida, expressava assim a nossa cultura futura que chegaria a partir de nós mesmos e que nós por isso antes de tudo precisávamos da confiança em nossas capacidades. Tudo isso era um esboçar. Agora, neste último dia na cozinha de Coppi, eu via a dimensão do que se iniciara, o que fora reunido por nós, por isso se passara a hora breve, preenchida livros e lugares, quadros e oficinas, museus e realidades políticas, antes do início do exercício de proteção aérea. Os anos que eu tinha passado neste país [Alemanha] tornavam-se notadamente compactos, eu me encontrava numa reviravolta, numa transição para um novo período de vida. Porém isto era então a correta definição, nós perguntávamos, quando falávamos sobre a minha vindoura viagem, a mudança de residência possuía ainda uma importância quanto às tarefas diante das quais nos posicionávamos, que eram as mesmas em todo parte e nos mantinham unidos. Após as cenas de batalhas em Arezzo, disse Coppi, ao saudar recapitulando o nosso período Francesca, e entregava-me uma das figuras dos inícios de nossa atividade artística subversiva. Tratava-se de uma série de cartões de comandantes do exército desde a Guerra Mundial [de 1914-18] e os grandes do Partido fascista [do NSDAP, os nacional-socialistas, a.k.a. nazistas], que ele tinha transformado em caricaturas ofensivas. Elas seriam preenchidas com palavras-de-ordem, nas quais de modo grosseiro lembram os conhecidos, que eles [os fascistas] eram, falsários de diplomas, ladrões da cultura popular, racistas, assassinos em massa, e para ficar mais completa a explicação sobre as intenções deles, eles seguravam um punhal, um machado, uma pistola. A partir destas caricaturas, que ele fixava em quadros-de-aviso do trem subterrâneo [metrô] e em tabela de horários de ônibus ou tinha colado em colunas para cartazes, sobre placas para grandes comícios, mais tarde originariam os panfletos copiados por ele mesmo, graças aos quais, quando os distribuía diante de uma fábrica, ele seria preso. Porém Heilmann tirou de mim a figura. Sempre ainda, ele disse, vocês subestimam o aparato de poder do adversário. Ele se ofereceu para guardar os desenhos de Coppi, como também os escritos escondidos junto ao fogão, no porão da casa de seus pais, onde não seriam descobertos, e sugeria, por precaução, além disso, no brasão da porta, pendurar uma foto do Führer, o que devia impressionar a qualquer um que entrasse, de um modo diverso.








[pausa]





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mais sobre Dante, Inferno
http://pt.wikipedia.org/wiki/Dante_Alighieri
http://pt.wikipedia.org/wiki/Divina_Comédia
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Pietro della Francesca
http://pt.wikipedia.org/wiki/Piero_della_Francesca
http://www.ibiblio.org/wm/paint/auth/piero/
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Mantegna, Masaccio, Grien, Grünewald, Dürer
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http://pt.wikipedia.org/wiki/Masaccio
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La Tour, Vermeer, Chardin
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http://pt.wikipedia.org/wiki/Pieter_Brueghel_o_velho
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em breve o bloco 8 ...........

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